Apresentação

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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Capítulo III - Cinco Minutos

Ao chegar em casa no dia seguinte, achei em casa uma carta.
Antes de abri-la percebi que era dela, porque o envelope estava com o mesmo perfume que senti quando a conheci.
Eis o que dizia:
"Pensa mal de mim, meu amigo; nenhuma mulher pode desprezar um bom coração como o seu.
"Se me escondo, se fujo, é porque há um fatalidade que me obriga a fazer isso. E só Deus sabe quanto me custa este sacrifício, porque eu te amo!
Mas não devo ser egoísta e trocar sua felicidade por um amor desgraçado.
"Esqueça-me.
C.”

Reli não sei quantas vezes esta carta, e, apesar da delicadeza de sentimento que aparecia em suas palavras, o que para mim ficava bem claro é que ela continuava a fugir de mim.

Essa assinatura era a mesma letra que marcava o seu lenço e à que eu, desde a noite passada, tentava decifrar para encontrar um nome!

Fosse qual fosse esse motivo que ela chamava “uma fatalidade” e que eu supunha ser apenas desculpa, ou uma brincadeira sem graça, o melhor era aceitar o seu conselho e me esforçar para esquecê-la.

Refleti então friamente sobre o exagero da minha paixão e conclui que precisava tomar uma decisão definitiva.

Não era possível que continuasse a correr atrás de um fantasma que desaparecia quando ia tocá-lo.

Para grandes males os grandes remédios, como diz Hipócrates. Resolvi fazer uma viagem.

Mandei selar o meu cavalo, coloquei alguma roupa em um saco de viagem, embrulhei-me no meu casaco e saí, sem me importar com a manhã de chuva que fazia.

Não sabia para onde iria. O meu cavalo levou-me para o Engenho-Velho e eu daí me encaminhei para a Tijuca, onde cheguei ao meio-dia, todo molhado e cansado pelos maus caminhos.

Se algum dia se apaixonar, minha prima, aconselho as viagens como um remédio, talvez o único eficaz.

Tive um excelente almoço no hotel; fumei um charuto e dormi doze horas, sem ter um sonho, sem mudar de lugar.
Quando acordei, o dia começava a aparecer sobre as montanhas da Tijuca.

Uma bela manhã, fresca e cheia de gotas de orvalho, abria o seu manto azul por entre a cerração, que se desmanchava aos raios do sol.

A aparência desta natureza quase virgem, esse céu brilhante, essa luz admirável, caindo em cascatas de ouro sobre as encostas dos rochedos, tranquilizou completamente o meu espírito.
Fiquei alegre, o que há muito tempo não me acontecia.

Um outro hóspede, um inglês franco e cavalheiro, convidou-me para caçar com ele; ficamos o dia todo correndo atrás de duas ou três marrecas.
Assim passei nove dias na Tijuca, vivendo uma vida estúpida tanto quanto pode ser: dormindo, caçando e jogando bilhar.

Na tarde do décimo dia, quando já me imaginava perfeitamente curado e estava admirando o pôr-do-sol, e a lua, que derramava no espaço a sua luz doce e acetinada, fiquei triste de repente.
Não sei que caminhos tomavam os meus pensamentos; o fato é que daí a pouco descia a serra no meu cavalo, lamentando esses nove dias longe de casa, o que talvez me tivessem feito perder para sempre a minha desconhecida.

Acusava-me de infidelidade, de traição; o meu orgulho dizia-me que eu devia ao menos ter dado a ela o prazer de ver-me.
Que importava que ela me ordenasse que a esquecesse?
Não tinha confessado que me amava, e não devia eu resistir e vencer essa fatalidade, contra a qual ela, mulher frágil, não podia lutar?

Tinha vergonha de mim mesmo; achava-me egoísta, covarde, bruto, e revoltava-me contra tudo, contra o meu cavalo que me levou para Tijuca, e aquele hóspede, cuja simpatia me fez ficar mais tempo por lá.
Com estes questionamentos na mente e uma grande confusão de espírito cheguei à cidade, mudei de roupa e ia sair, quando o meu empregado me deu uma carta.
Era dela.

Senti uma surpresa misturada de alegria e de remorso:
"Meu amigo.
"Estou disposta a sacrificar o meu amor para a sua felicidade; mas ao menos deixe-me o consolo de amá-lo.
Há dois dias que espero em vão vê-lo passar e acompanhá-lo de longe com um olhar! Não estou reclamando; você não sabe nem deve saber em que ponto de seu caminho o som de seus passos faz bater mais forte meu coração.
Sigo hoje para Petrópolis, de onde voltarei breve; não lhe peço que me acompanhe, porque jamais deverá me conhecer, eu, uma sombra escura que passou um dia pelos sonhos dourados de sua vida.
Entretanto eu queria muito vê-lo mais uma vez, apertar a sua mão e dizer-lhe adeus para sempre”.
"C."

A carta tinha a data de 3; nós estávamos no dia 10; ela tinha partido há oito dias para Petrópolis e me esperava.

No dia seguinte embarquei na Prainha e fiz essa viagem da baía, de paisagem tão agradável, mas sem conseguir apreciar absolutamente nada.
Nem mesmo a majestade dessas montanhas de pedra, a poesia desse imenso mar, sempre calmo como um espelho, os grupos de ilhotas graciosas que circulam a baía, nada disto me chamava a atenção.

Só tinha uma idéia... chegar; e o barco seguia mais lento que meu pensamento.
Durante a viagem pensava nas coisas que a sua carta me revelara, e tentava lembrar de todas as ruas por onde costumava passar, para ver se adivinhava aquela onde ela morava e de onde, todos os dias, me via sem que eu percebesse.
Para um homem como eu, que andava todo o dia desde a manhã até a noite, a ponto de merecer que a senhora, minha prima, me apelidasse de Andarilho, este trabalho era muito difícil, quase impossível.
Quando cheguei a Petrópolis, eram cinco horas da tarde; estava quase noite.

Entrei no hotel suíço, ao qual nunca mais voltei, e enquanto me serviam um magro jantar, que era o meu almoço, pedi informações.
— Têm vindo estes dias muitas famílias? perguntei eu ao empregado.
— Não, senhor.
— Mas, há coisa de oito dias não vieram da cidade duas senhoras?
— Não tenho certeza.
— Pois pergunte, que preciso saber já; isto o ajudará a obter informações.
A cara fechada do moço abriu-se num sorriso ao ver a cor do dinheiro estendido e começou a soltar a língua .
— Talvez o senhor queira saber de uma senhora já idosa que veio acompanhada de sua filha?
— É isso mesmo.
— A moça parece-me doente; nunca a vejo sair.
— Onde está morando?
— Aqui perto, na rua de...
— Não conheço as ruas de Petrópolis; o melhor é você vir mostrar-me a casa,
— Sim senhor.
Saímos, eu e o rapaz, por uma das ruas da cidade em busca do endereço dela.

Mito da caverna

Mito da caverna
Aluno Elidio